Kruw: A Liderança Doce e Resiliente de uma Mulher Krahô

Conheça a história da Kruw, uma figura central na preservação e promoção da cultura Krahô. Sua trajetória é marcada por desafios e conquistas, refletindo não apenas a força pessoal, mas também o papel vital das mulheres indígenas na manutenção das tradições e na luta pela preservação do Cerrado brasileiro.

Autora:  Ivi Pauli

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Um início marcado por lágrimas e gratidão

Desde o início, a vida da Kruw, conhecida também como Cruwakwyj Krahô (ou Luzia), foi marcada por desafios, resiliência e entrega. Nascida na Aldeia Nova, no município de Goiatins, estado do Tocantins, em uma época onde não havia internet nem telefone, apenas o rádio, sua história começa com um episódio de muita dor seguido de imensa alegria e gratidão.

Após seu nascimento, uma notícia devastadora foi enviada à avó de Kruw: sua neta havia nascido, mas não tinha sobrevivido. Tomada pela tristeza, a anciã andou a pé, durante um dia e uma noite, até chegar à casa onde a filha havia dado à luz. Lá, encontrou a pequena menina, chorando sem parar: estava viva! Que alívio! A notícia de sua morte havia sido um erro, e a alegria da avó ao vê-la com os pulmões fortes marcou profundamente o início da sua trajetória.

Crescendo com sua mãe, que se tornou sua maior apoiadora e inspiração, Kruw enfrentou o preconceito do próprio pai, que não a aceitou por suas características físicas e deixou a família. Ainda assim, foi escolhida para ser a Rainha do Peixe, uma posição de honra em sua comunidade, o que exigiu um período de resguardo de quatro anos, durante o qual ela se dedicou aos estudos em casa.

A Ascensão de Uma Liderança Feminina Inspiradora

Com o apoio incondicional de sua mãe, Kruw completou sua educação e seguiu o conselho de sua família para se tornar independente. 

“Durante o resguardo eu aproveitei, estudei, terminei meu ensino médio. E depois dos 18 anos, a minha mãe falou para mim, para eu trabalhar e ser independente. E acabei aceitando o conselho da minha mãe e da minha tia. E pela primeira vez eu entrei na sala de aula. Para dar aula para as pessoas mais velhas.”

Kruw

No primeiro emprego, como professora, Kruw encontrou sua vocação em ensinar, não apenas crianças, mas também adultos, e gosta de dizer, com orgulho, que aprendeu tanto quanto ensinou. Esse caminho a levou a uma carreira rica e diversificada, incluindo seu papel como atriz no filme “A Flor de Buriti”, com o qual atualmente viaja em turnê de lançamento pelo Brasil.

Hoje, Kruw é uma líder influente em sua comunidade, liderando as Guerreiras do Cerrado e trabalhando incansavelmente para promover a preservação ambiental e a valorização das tradições Krahô. Sua participação no programa Polinizadores da Rede Meli é mais um passo em sua jornada de aprendizado e compartilhamento de conhecimento, mostrando às mulheres de sua comunidade e de outras aldeias que é possível superar as adversidades e alcançar grandes realizações com persistência e dedicação.

A doçura e a feminilidade de Kruw são reflexos profundos de sua identidade Krahô, que ela abraça com orgulho e manifesta em cada ação e ensinamento. Sua trajetória demonstra que a verdadeira força vai além da resistência, englobando também a habilidade de acolher, educar e transformar a realidade ao seu redor. Kruw é um exemplo notável de como a força da mulher Krahô pode ser expressa por meio da doçura e da feminilidade, sendo uma fonte constante de inspiração e mudança para sua comunidade e além.

Como professora e atriz, Kruw não só ensina e inspira sua comunidade, mas também ajuda a transformar a percepção das tradições Krahô, mostrando que é possível conciliar respeito pelas raízes culturais com inovação e impacto social. A seguir, Kruw compartilha conosco um pouco mais sobre a cultura de seu povo, que vive no Cerrado brasileiro.

Resguardo e Tradições Alimentares

O “resguardo” foi muito importante durante a formação da Krûw. Esse período é uma fase de reclusão e cuidados especiais que se segue ao nascimento de uma criança ou à primeira menstruação de uma jovem. Um momento que ilustra a importância dos rituais de passagem na cultura indígena. Durante o resguardo, há uma série de restrições alimentares, incluindo a abstinência de sal e gordura, com o objetivo de preservar a saúde e evitar o envelhecimento precoce. Essas práticas refletem a riqueza das tradições Krahô e se estendem à forma como os alimentos são preparados e consumidos.

Como Kruw explicou, “Durante o resguardo, não comemos sal nem gordura para manter nossa saúde e evitar o envelhecimento rápido. Após quinze dias, podemos comer alimentos com sal, mas apenas uma pequena porção, como uma demonstração da nossa tradição. É um sinal de respeito e cuidado com a nossa ancestralidade“. Ela também compartilha a experiência de comer paparuto (ou berubu), uma comida tradicional que é preparada com massa de mandioca recheada com caça e envolta em folhas de banana, mostrando a riqueza e diversidade da culinária indígena.

Preservação e Futuro

Kruw não se limita a preservar a cultura Krahô; ela a redefine, projetando-a para um futuro vibrante e sustentável. Ao construir uma biblioteca de saberes e histórias, ela não está apenas documentando o passado, mas também iluminando as possibilidades do amanhã. Cada esforço seu para registrar músicas e narrativas tradicionais é um ato de resistência criativa e uma afirmação de sua visão para uma continuidade cultural que ressoa e evolui. 

O trabalho de Kruw é uma ponte entre gerações, uma celebração da força ancestral que molda o presente e inspira o futuro. Em sua dedicação, ela nos lembra que a verdadeira inovação cultural não se distancia das tradições, mas se nutre delas, criando uma tapeçaria rica e dinâmica que perpetua e reinventa a identidade Krahô.

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