Pedral do Lourenço: a resistência ribeirinha diante do “progresso”

O que significa progresso quando ele silencia o rio e seu povo? Conheça a história de Porto Novo e a resistência ao longo do Rio Tocantins — leia mais no artigo completo.

Autora: Ana Carolina Cavalcanti

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Aos olhos de Brasília, o projeto parece promissor: transformar o rio Tocantins em uma via navegável plena, permitindo que barcaças carreguem soja, minério e combustíveis o ano inteiro.

Mas, para quem vive nas margens desse rio, esse plano não é progresso. É ameaça.

O que está em jogo

A comunidade Porto Novo, em Goianésia do Pará, vive uma ansiedade constante desde que a derrocagem do Pedral do Lourenço foi aprovada — um processo que consiste em explodir ou remover formações rochosas do leito do rio para permitir a passagem de grandes embarcações o ano inteiro.

Durante a cheia, o rio permitia a navegação; mas, na vazante, as barcaças ficavam presas. A derrocagem é apresentada como a solução “técnica” para esse problema.

Mas por trás dessa solução há nomes e histórias que jamais aparecem nos documentos oficiais.

Porto Novo, por exemplo, não foi incluída entre as comunidades afetadas, por estar localizada cerca de 40 km do trecho. Alegaram critérios territoriais rígidos.

O que ignoram é que essa comunidade vive em uma ressaca do rio, um braço marginal onde tudo que flui no Tocantins principal termina chegando.

Não é uma margem isolada: é parte viva do sistema hídrico, que recebe sedimentos, resíduos e alterações do fluxo.

“Nós estamos preocupados, como vai ser a pesca”, diz Rosa Maria, moradora de Porto Novo e integrante da Rede Meli.

E ela tem razão: se os detritos e resíduos das explosões forem lançados nas águas, os peixes somem, a reprodução é afetada e as técnicas tradicionais de pesca se tornam inviáveis.

Licença liberada, povo silenciado

Para agravar, o Ibama emitiu a licença de instalação sem que muitas comunidades fossem consultadas adequadamente.

Os estudos ambientais e sociais têm lacunas graves: não medem quem realmente vai perder com as explosões, não consideram o deslocamento dos peixes e nem estimam os impactos de longo prazo sobre o rio e suas espécies.

Uma vistoria judicial recente, apontada em reportagem d’O Eco, confirmou essas falhas.

Em julho, após ações do Ministério Público Federal e denúncias de movimentos sociais, a Justiça suspendeu a licença, segundo o Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB).

Mas isso não significa que a ameaça foi removida: os processos seguem em disputa, decisões ainda pendem, e a comunidade de Porto Novo vive sem garantia de voz e exposta ao risco.

O Futuro de Porto Novo

Se as previsões da comunidade se confirmarem, Porto Novo pode deixar de existir.

Neste cenário, muita gente já pensa em se organizar para migrar, porque sem água limpa, sem peixe e sem um rio saudável, resta pouco para viver.

Não é exagero dizer que comunidades como Porto Novo podem ser apagadas no silêncio burocrático das licenças ambientais.

A lógica dos “grandes projetos” — que fala de modernização, integração logística, crescimento econômico — esmaga o que há de mais essencial e invisibilizado: os modos de vida tradicionais.

O relato de Rosa Maria, que representa Porto Novo, ecoa de muitas outras comunidades amazônicas que hoje lutam para continuar existindo em seus territórios.

Enquanto o Brasil se prepara para sediar a COP30 e falar de transição ecológica, é preciso ouvir quem vive à beira do rio.

Porque o progresso que apaga comunidades é devastação.

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