Violência nas questões de terra marcam esta parte da Amazônia. Há 25 anos, no dia 17 de abril, aconteceu o massacre de Eldorado do Carajás. Wellington, morador do Assentamento 1º de março, no município de São João do Araguaia-Pará, nos escreveu sobre o significado desta data.
Somos filhos e filhas dessa terra que produz
Somos farpas Paus e pregos desse pedaço de crus e nem mesmo as pinhas de chumbo podem nos calar
Nem mesmo a mordaça da morte ou medo do escuro, pois a noite é sempre mais escura antes do amanhecer.
Submergimos e emergimos empunhados pra vencer, porque a nossa rebeldia se descreve com três letras, MST.
(poesia filhos da terra, Wellington Saraiva Ferreira
17 de abril de 2016 curva do S Eldorados dos Carajás PA)
Autor: Wellington Saraiva Ferreira
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Ainda é abril. Para nós camponeses, sobretudo desse território do sul e sudeste do Pará, abril é um mês latente, porque emerge em nós um sentimento que vai desde a luta por reforma agraria, à justiça, que não foi feita, pois continua impune o que foi conhecido como o maior massacre de trabalhadores rurais já presenciado até o momento, a chacina de Eldorado dos Carajás.
Vinte e um trabalhadores foram assassinados naquele 17 de abril de 1996. Oziel Alves Pereira foi o mais jovem trabalhador morto no massacre: tinha 17 anos quando foi executado.
O episódio sangrento deixou marcas inapagáveis na nossa memória, pela desumanidade que foi, mas também por não deixarmos esquecer. Celebramos a memória de cada companheiro tombado, nas formações, nas conquistas, nas palavras de ordens, em cada cerca que rompemos, em cada arame que quebramos.
Assim, sugestivamente como pretende a estrofe da música, que diz “o chão regado a sangue a flor nasce mais forte” o massacre deixou frutos: a revolta dos trabalhadores resultou na ocupação da fazenda Pastoriza pouco tempo depois da chacina de trabalhadores em Eldorado dos Carajás. Deixou fruto, na mística de nosso movimento, em nossos acampamentos, na nossa juventude que, desde 2006, ao completar dez anos do massacre, iniciou acampamento da juventude sem-terra, Oziel Alves Pereira, transformando a curva do S em um amplo espaço de formação, de resistência e de memória.
Hoje, mediante a essa crise sanitária causada por essa pandemia de escala global, não fizemos o acampamento da juventude sem-terra Oziel Alves Pereira, mas não esquecemos. Fizemos uma jornada nacional de ações em defesa da vida, debatendo sobre a necessidade de lutarmos pela vacina, por um auxílio emergencial que de fato auxilie e fizemos, aqui no assentamento 1º de Março, no município de São João do Araguaia, palco histórico dos trabalhadores rurais, ações que tinham como meta conscientizar as nossas bases da necessidade de vacina e cultivamos o maior valor militante: a solidariedade.
Arrecadamos quase meia tonelada de alimentos para dividir com quem mais precisa nesse momento. As ações iniciaram no dia dez de abril como marco simbólico do nosso acampamento pedagógico. No dia 17 de abril, no ato de celebrar a memória dos nosso mártires, ocupamos a rodovia transamazônica (BR 230) por uma hora. Finalizamos a ação no dia 18/04, onde os nossos trabalhadores fizeram as entregas das cestas básicas em um ato de solidariedade e amor.
Estamos findando o mês, mas ainda é abril, viemos aqui então reafirmar o nosso compromisso com a classe trabalhadora camponesa. Enquanto houver nesse pais um palmo de latifúndio, irão ver uma bandeira vermelha, carnada, tremulando nos mastros dos acampamentos de beira de estrada por esse país afora.
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