Expansão de pastagens e polinizadores: investigando a relação entre a pecuária e as abelhas sem ferrão

As abelhas Jataí na Colômbia foram estudadas em uma nova pesquisa liderada por Diana Obregon e colaboradores. Tem curiosidade em saber se a produção animal pode afetar as abelhas sem ferrão? Vamos entender a pesquisa e suas principais descobertas.

Autora: Ana Paua Cipriano
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Nas últimas décadas, ficou claro que os pesticidas, usados para controlar insetos em vários cultivos, estão impactando na saúde e na sobrevivência dos polinizadores. Como resultado de vários estudos, alguns pesticidas que ameaçam a sobrevivência das abelhas, por exemplo, foram restringidos ou proibidos. No entanto, os ambientes podem ser complexos, e os pesticidas podem não ser os únicos poluentes que impactam os polinizadores.

Entre a imensa diversidade de polinizadores nos trópicos, as abelhas sem ferrão representam o grupo mais diverso de abelhas sociais. Essas abelhas podem polinizar não apenas áreas naturais, mas também cultivos, fornecendo um serviço ecológico essencial. Como um reflexo da urbanização, o comportamento dos polinizadores nativos vem passando por mudanças. Por exemplo, ao invés de árvores, algumas abelhas sem ferrão agora constroem seus ninhos em paredes e postes de iluminação pública, estruturas que não eram naturais para elas em um passado não tão distante.

Essas mudanças de comportamento também estão presentes quando as abelhas saem de seus ninhos para coletar alimentos. Ao visitar flores, as abelhas geralmente têm que lidar com os impactos de uma paisagem em mudança, com mais pastagens e produção animal. Nesse contexto, um estudo realizado na Colômbia com abelhas Jataí (Tetragonisca angustula) liderado por Obregon e colaboradores (2024) descobriu que essas abelhas também são impactadas por medicamentos antiparasitários aplicados ao gado, como a ivermectina.

A ivermectina é um medicamento antiparasitário comum que tem de baixo a médio nível de toxicidade em mamíferos. No entanto, pode ser altamente tóxico para invertebrados. Na pecuária, a ivermectina é aplicada ao gado – mas como isso está associado às abelhas sem ferrão?

A resposta pode estar nas fezes e na urina do gado, uma vez que esses excrementos estão no solo, a ivermectina pode ser absorvida pelas plantas e, em um processo chamado biotransformação, ela se torna um composto diferente, a abamectina. No estudo com abelhas Jataí, os pesquisadores encontraram uma quantidade expressiva de abamectina nos alimentos coletados por algumas colmeias. Em áreas com mais pastagens, também havia mais abamectina.

Isso pode representar um novo impacto da expansão de pastagens para gado em abelhas nativas e polinizadores, uma rota não explorada anteriormente.

Figura: Os resíduos de ivermectina nas fezes do gado podem ser absorvidos pelas plantas, biotransformados em abamectina e tornarem-se disponíveis para as abelhas sem ferrão. As forrageiras podem coletar esse alimento contaminado e acumular altas quantidades desse produto químico nos ninhos. Figura adaptada de Obregon et at. (2024)

Com essa nova descoberta, os pesquisadores também testaram a sobrevivência das abelhas quando expostas à abamectina, com o objetivo de entender quão resistente essa espécie pode ser a esse produto químico. As operárias de Jataí foram alimentadas com uma solução de água com açúcar e abamectina. Os resultados desse experimento revelaram uma informação muito interessante sobre essas pequenas abelhas: os ninhos que estão em áreas com uma proporção maior de pastagem são mais resistentes a esse pesticida. As taxas de mortalidade, portanto, foram maiores para as abelhas em áreas menos dominadas pelo gado, destacando que as abelhas em áreas mais expostas a esse produto químico são mais resistentes a seus efeitos.

Para proteger as abelhas nativas e apoiar a polinização, é importante entender os impactos que elas estão enfrentando e como mitigá-los. Ao invés de apenas focar em pesticidas tradicionais aplicados em cultivos, também é crucial investigar outras fontes de contaminação ambiental: o solo, a água e até os produtos veterinários aplicados ao gado.

Como mais florestas e recursos naturais estão se tornando áreas de pastagem, a responsabilidade de gerenciar o impacto das atividades antropogênicas nas espécies nativas também deve aumentar. Desenvolver pesquisas de alta qualidade e estabelecer uma comunicação clara com grupos interessados e gestores de políticas públicas é essencial para manter as abelhas sem ferrão e outros polinizadores saudáveis.

Referência:
Obregon, D., Guerrero, O., Sossa, D., Stashenko, E., Prada, F., Ramirez, B., … & Poveda, K. (2024). Route of exposure to veterinary products in bees: Unraveling pasture’s impact on avermectin exposure and tolerance in stingless bees. PNAS nexus, 3(3), pgae068.

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